quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

A necessidade e o desejo




Nos primórdios, o homem para adquirir produtos utilizava a troca. Ele produzia feijão e trocava por farinha. Porém, só comprava a farinha porque realmente precisava, e utilizava como moeda, no caso, outro produto. Tais trocas ocorriam porque havia a necessidade de comer, vestir, morar, sem que esta necessidade se tornasse vontade, prazer.
A realidade que se observa hoje nem de longe lembra as origens comerciais, desde o mercantilismo até o feudalismo. A produção em série e avanços tecnológicos levaram à criação da cultura de consumo, que até então não existia como tal. A indústria teve que mostrar e criar no consumidor a idéia de que ele “realmente” precisava do produto, “fazer crer a necessidade”.
Ações corriqueiras se tornaram uma batalha consumista na hora de escolher seus produtos. Um produto que você sempre consumiu, e não demorava mais de alguns segundos para escolher, hoje lhe toma até 5 min na frente da prateleira, em que você fica ali, vendo todos os benefícios e utilidades dos novos produtos que são oferecidos, sem lembrar que tudo tem um custo, e nesse caso, uma aba a mais ou pacotinho colorido pode encarecer absurdamente o produto.
Quando me tornei mocinha, entrei para o fantástico mundo das mulheres que usam absorventes – embora, muito antes disso, já usasse só para ficar treinando, mas não era eu quem comprava, é claro. Sempre sonhei com esse momento, mal sabia eu no que estava me metendo.
Meu primeiro pacote, lógico, minha mãe comprou. Porém, quando tive que ir até o mercado comprar pela primeira vez um pacote de absorventes, vi que eles não eram somente absorventes. Nossa... Uma infinidade de tipos, tamanhos, cores e adornos me confundiram tanto que cheguei em casa com um absorvente noturno, tamanho extra-grande e sem abas, para ser utilizado por uma criança de 11 anos.
Essa confusão que os pacotes de absorventes me causaram é a realidade da situação. A mulher precisa apenas de um absorventes que caiba em si; porém, é um mar de novidades que, além de encarecer o produto, faz com que a consumidora acredite que realmente precisa das “diferenças” que tal marca apresenta.
Absorventes black, pra quando ela for usar uma calcinha preta; mais finos atrás, para se acomodar melhor; cobertura seca, em gel ou com outras coisas estranhas que não mudam nada; embalagens coloridas que escondem a mesmice do produto e a falta de necessidade de adquiri-lo. O consumo fala mais alto e a cultura que o envolve age diretamente na pessoa que vai consumir. O papel principal da indústria do consumo é este, levar o consumidor a crer que ele necessita das diferenças que o produto oferece.
Essas diferenças não alteram a função do produto (qual a necessidade de se ter um absorvente com a embalagem rosa pink? – na verdade, nenhuma), mas a persuasão da cultura consumista é tamanha que de fato acaba criando o desejo de aquisição do absorvente de pacote rosa, por mais que por dentro ele seja branco. E a existência de uma aquisição desse tipo se legitima no momento em que ela vai ao banheiro da festa, uma amiga pede um absorvente emprestado e ela, linda, tira da bolsa uma fashion e pink embalagem minúscula, lembrando que com certeza a dona deve ter visto o produto na propaganda da novela das oito. Já era... Depois desses segundos sagrados, todas as meninas que estavam no banheiro vão correr ao supermercado mais próximo para comprar o mesmo absorvente com embalagem rosinha. Agora, pergunta se elas precisam do absorvente ou da embalagem...

Eveline Poncio

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